Meu Estúdio Maravilhoso
O Delito de Madeleine
Sexta-feira, Julho 9, 2021

Compaixão é entender e mostrar interesse por alguém que está em dificuldades ou cometeu um erro.1

Madeleine McNally, de 15 anos, tinha cometido um erro — bem, não apenas um erro. Foi uma enorme e embaraçosa mancada, e ela estava bem encrencada. Na verdade, pela reação dos amigos, colegas e supervisores, era mais como se ela tivesse cometido um pecado capital.2

Ela não era … minha amiga, nem nada do gênero.

Compaixão é sentir a dor de alguém que está em dificuldades, mesmo que você não conheça a pessoa.

Ela também não era do tipo com quem eu gostava de andar, nem eu me encaixava com as amigas delas, que eram tinham sido muitas, porque Madeleine era muito atraente e comunicativa, com um caráter muito franco e audacioso. Mas essas características agora a tinham feito se meter em dificuldades, o que levou suas supostas amigas a renegá-la. Mas acho que, na verdade, foi bom para ela, mas eu não parava de pensar numa aula de formação de caráter que estudara recentemente em casa, “Sentir Pena na Prática.” …

Quando as pessoas estão se sentindo mal ou se encontram em dificuldades, geralmente se sentem muito sós. O fato de se sentirem sós pode piorar ainda mais as coisas. Nesses momentos, começam a acreditar que ninguém as entende nem se importa absolutamente nada com elas.

“Bem que eu sabia…,” diziam algumas pessoas durante o intervalo do almoço. Vera Jennings, a melhor amiga de Madeleine, que geralmente me ignorava, até veio sentar-se perto de mim, para ver se eu tinha ficado sabendo. Respondi que tinha ouvido alguma coisa, mas nada específico.

“Olha, Christina”, disse Vera baixando a voz, que só atraiu mais a curiosidade de outros ao seu redor, “entenda que eu não gosto de fazer fofoca, mas parece…”

Eu me senti horrivelmente mal de ficar escutando, mas os “detalhes” eram tentadores e suculentos, e os resultantes sussurros e as caras de surpresa continuaram desde o refeitório até à sala de aula e só foram interrompidos por um silêncio desconfortável quando Madeleine McNally entrou. O rubor do seu rosto contradizia a indiferença que tentava demonstrar, enquanto se dirigia para sua mesa, no fundo da sala, onde geralmente “presidia ao tribunal”, junto com suas admiradoras, até a professora chegar.

Agora era quase excruciante encontrar essas admiradoras de outrora, que literalmente lhe viravam as costas e se continham para não rir dela. Acho que devia ser quase tão insuportável como encarar seus pais aquela noite, sabendo que eles deviam ter recebido um relatório do diretor da escola.

Seus pais não tinham incutido nela muitos princípios morais, porque eles raramente se encontravam em casa; mas como eram ricos e tinham uma vida social muito ativa, deviam estar furiosos, porque no final de semana, os membros do Clube dos Homens e principalmente a Associação das Mulheres Irlandesas, já estariam totalmente a par do mau comportamento de Madeleine.

Eu não sabia por que, mas durante a aula da tarde, não conseguia parar de me virar e olhar para Madeleine. Talvez estivesse curiosa de saber como alguém tinha a coragem de fazer o que ela aparentemente tinha feito, e até me questionava se estaria na minha natureza alguma vez fazer o mesmo.

Cheguei à firme conclusão de que não. Na realidade eu não conseguia me identificar com aquilo. Mas continuava olhando para ela furtivamente, até que ela reparou e me devolveu um olhar gelado. Voltei minha atenção de volta para a aula e, tal como ela, me esforcei para me concentrar no quadro e no monólogo do Dr. Brennan.

Ser compassivo mostra à pessoa que ela não está só. Faz de você o amigo que ela está precisando.

Alguns momentos depois, lancei outra olhada na direção de Madeleine McNally. Ela interceptou o meu olhar e consegui dar um sorriso de aceitação apesar de sua expressão carrancuda. Desta vez, seus olhos se encheram de lágrimas, e ela se levantou.

“B-banheiro,” murmurou e dirigiu-se para a porta.

“Mas professor, a senhorita McNally não levantou a mão nem pediu para ser dispensada,” disse uma das garotas.

“Deixem-na em paz,” disse o Dr. Brennan baixinho. “Ela provavelmente vai gostar de ter um tempinho de reflexão interior.”

Quinze minutos depois, Madeleine voltou com ar de determinação, mas seus olhos vermelhos demonstravam dor.

Sem compaixão, o mundo é um lugar duro e solitário.

Logo a aula da tarde tinha terminado, e juntamos nossas canetas, livros, cadernos e bolsas para sair. Olhei para trás enquanto nos dispersávamos. Madeleine continuava sentada e o Dr. Brennan tinha um brilho de compreensão nos olhos enquanto guardava seus papeis dentro de uma pequena mochila de couro bem usada.

“Não vai embora, senhorita McNally?”

“Ainda não, senhor, se não se importa.”

“Tome o tempo que precisar. Vou pegar uma xícara de chá para mim e só vou fechar a sala daqui a … ummm … mais ou menos uma meia hora.”

A compaixão nos une, e quando vemos que os outros entendem e se importam é muito mais fácil atravessar os momentos difíceis.

Orando em silêncio por compreensão, voltei para a sala e, hesitante, me dirigi até Madeleine.

“Posso sentar?”

Madeleine deu de ombros e olhou bem para a frente. Apesar de ter vontade de ir embora, sentei na carteira ao seu lado e ela me perguntou o que eu queria.

Compaixão é realmente se importar e querer ajudar, ainda que a única coisa que possa fazer seja ouvir e dizer palavras amáveis.

“Talvez conversar,” disse eu casualmente. “Ou escutar. Ou ficarmos em silêncio juntas. Ou também posso dar o fora, como você quiser.”

“Então, agora que sou alguém de quem se envergonhar, você quer se associar a mim?”

“Não é isso. Eu só queria ser … sua … amiga.”

Madeleine riu. “Que estranho.”

“Estranho? Por quê?”

“Ué, quando eu era a ‘rainha’ da cocada branca você parecia me evitar.”

“Mesmo?”

“É. Achava que tinha inveja de mim.”

Dei uma risadinha e fiquei corada reconhecendo que talvez houvesse um quê de verdade nisso. Madeleine continuou destemidamente.

“Então é mais fácil para você agora que eu não sou mais tão importante, e estamos no mesmo nível, certo?”

Tentada a recuar com esse ceticismo tão severo, orei novamente em silêncio por compreensão. “Claro que não. Eu só não me identifico com ser popular e com a turma com quem você se mete... acho.”

“Correção — com quem eu me metia. Que furada essa filosofia de que ‘o amor é cego’. Agora que elas viram os meus erros, me odeiam. Então, o que você acha dos meus … um … erros?”

“Todos cometemos erros,” respondi. “E tem coisas muito piores no nosso coração, pelas quais todos precisamos ser perdoados, se a verdade viesse à tona.”

Madeleine riu. “Perdoados? Por quem?”

“Por Deus,” respondi.

“Umm. Coisas piores como o quê?”

“Ah … inveja, ódio, orgulho, hipocrisia. Coisas assim. …”

“Os sete pecados capitais,3 certo?”

“Acho que sim.”

Madeleine deu uma gargalhada e sua expressão ficou mais amigável. “Olha, sabe uma coisa? Tenho observado sua reação ao que fiz. Você não vai acreditar, mas significa muito para mim. Não sei exatamente por que, talvez a fofoca que rola sobre sua família ser religiosa e … você sabe.”

“Fofoca…,” repeti com um gemido.

“É, nem me fale. Bem-vinda ao clube! Mas, de qualquer jeito, eu queria conhecer você, mas também mantinha distância, não porque me achasse melhor. Quer saber por quê?”

“Por causa do que os outros iam pensar?”

Madeleine resmungou. “Eu geralmente não estou nem aí com o que os outros pensam. Nunca me importei. Talvez seja isso que me fez popular!

“Não,” continuou ela, baixando a voz. “Eu te evitava, porque sabia que você ia me expor ou algo assim. Eu me sentia à vontade perto de você, mas ao mesmo tempo você me incomodava. Estranho, né? Puxa, isso não é interessante? É preciso chegar no fundo do poço para sermos verdadeiros!”

“Com Deus, para subir você tem primeiro que cair,” comentei corajosamente.

Deus. Você acredita em Deus, não é mesmo?”

Acenei afirmativamente.

“Ummm, é óbvio. Você ora?”

“Converso com Jesus,” disse eu. “É mais do que apenas Lhe pedir coisas.”

“Eu também,” disse Madeleine. “Como um amigo … ou mais. Depois penso ‘ei, eu devia estar na igreja’ e fico petrificada e me calo. Você vai à igreja?”

“Fui uma vez no Natal, quando era criança,” respondi. “Cantamos lá.”

Madeleine agarrou a mochila e se levantou. “Ah … Christina, é sexta-feira à noite, e eu geralmente fico um pouco fora com as minhas … ha … ‘amigas’ e comemos uma pizza. Parece que somos só nós duas. Quer vir? E ainda por cima estou com certa pressa para ir para casa e me encontrar com meus pais.”

Algumas dessas “amigas” — Vera Jennings era uma delas — que sem dúvida estavam se interrogando sobre o que as duas conversavam, estavam por ali, na frente do portão principal da Escola Secundária Cristo Rei, quando Madeleine e eu saímos de braço dados e sorrindo.

“Está tudo bem, Vera!” disse Madeleine, apontando para o letreiro da escola. “Ele já me perdoou.”

“Quem?”

“O próprio Rei! E também vai perdoar a você se Lhe pedir.”

Devo admitir que Vera parecia assombrada com a declaração de Madeleine, e eu disse que explicaria para ela com calma.

Caros leitores, você vão ficar felizes em saber que, daquele dia em diante, Madeleine e eu nos tornamos amigas inseparáveis. Ah, e imagino que, depois de tudo que lhes contei, devem estar morrendo de curiosidade para saber o que Madeleine fez de errado. Olha, vou correr o risco de parecer mal educada, mas devo dizer que não é da sua conta.

Parabéns! Você está praticando compaixão quando percebe que alguém está magoado ou precisa de um amigo.

Fim

1 As citações nesta história são extraídas de The Family Virtues Guide (1997), Linda Kavelin Popov e Dan Popov, Ph.D., e John Kavelin, Plume.

2 pecado capital: um pecado considerado gravíssimo e condenável, como um dos sete pecados capitais.

3 os sete pecados capitais: grandemente difundidos na Idade Média como os pecados que levavam à maldição: orgulho, cobiça (ganância), luxúria, ira, glutonaria, inveja e indolência.

Ver o suplemento de “O Delito de Madeline”
Autoria de Gilbert Fentan. Ilustrações de Jeremy.
Publicado pelo My Wonder Studio. Copyright © 2021 por A Família Internacional
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Tagged: histórias infantis, compaixão