Meu Estúdio Maravilhoso
O Jornaleiro
Sexta-feira, Dezembro 14, 2018

A noite da véspera de Natal foi extremamente fria. Depois de semanas frenéticas de compras, muita propaganda, luzes e ruídos, a cidade estava em silêncio. As ruas estavam cobertas de lama da neve derretida pelas pessoas que caminhavam apressadamente fazendo as compras de última hora.

O dia amanhecia, e ninguém tinha visto o jovem sem teto dormindo numa cama improvisada de trapos, jornais e cobertores velhos debaixo do viaduto perto da saída da cidade.

Seu nome era Sean. Seu único amigo no mundo era uma velha pomba que dormia na estrutura do viaduto. Vários pombos ficavam ali, e Sean dera o nome de “Assovio” à ave que mais gostava. Muitas vezes ele dava algumas migalhinhas da sua parca comida a Assovio e seus amigos, e ficava ali desfrutando do seu arrulhar e companhia.

Sean nunca conheceu seu pai, Jerry, que havia sido mandado para um posto no exterior pouco depois que ele nasceu. Levava junto com sua mãe uma vida simples, mas confortável. Sua mãe amava muito o Senhor, sempre orava e ensinara Sean a orar também. Parecia que nada jamais abalava a sua fé, nem mesmo quando receberam a notícia do terrível acidente no navio no qual Jerry se encontrava.

Durante anos difíceis e as muitas mudanças de lugar e de vida que ocorreram, Sean e sua mãe fortaleciam-se lendo as promessas de Deus na Bíblia. Eles acreditavam firmemente que de alguma forma todas as coisas iriam contribuir juntamente para o bem.

Sua mãe sempre tivera uma saúde fraca, e com o passar dos anos ficou ainda mais fraca. Os médicos informaram-na de que estava às portas da morte, e ela sabia que era apenas uma questão de tempo para unir-se ao seu marido no Céu. A mãe de Sean não podia trabalhar por conta dos seus problemas de saúde. Como a causa e as circunstâncias resultantes da morte do seu marido ainda estavam sendo investigadas, eles não recebiam pensão da firma, e logo tiveram que mudar de sua casa e ir para um apartamento em péssimas condições.

Assim que cresceu um pouco, Sean começou a trabalhar como jornaleiro, entregando jornais. Cada centavo que recebia era gasto nos estudos e na alimentação. Sua mãe havia vindo sozinha para aquele país quando adolescente, por isso, quando morreu, Sean ficou sozinho.

A assistente social no hospital explicou que ele seria levado para uma instituição estadual para rapazes. Nessa noite, Sean saiu sorrateiramente do apartamento e encontrou um lugar debaixo do viaduto, protegido do vento e das pessoas que passavam. A partir de então, começou a viver nas ruas, sempre escondendo-se o máximo possível, aprendendo a forma difícil de viver nas ruas e a escapar de pessoas que não eram nem de longe tão amáveis como sua mãe.

* * *

Agora, deitado debaixo da ponte, Sean mal conseguia acreditar que tudo aquilo lhe acontecera em apenas alguns meses. Entregando o jornal da manhã, ele continuava ganhando o suficiente para comer, mas não para ter um lugar onde morar.

Lá em cima, dava para escutar um pássaro que ele chamava de Assovio despertando e batendo as asas. Sean imitou o som do arrulhar e Assovio desceu, batendo as asas, à procura das migalhinhas de pão que ia ganhar. O rapaz jogou para aos pássaros umas crostas de pão. “Tenho que ir trabalhar”, disse, descendo a encosta até à calçada, e lá foi ele correndo para o depósito pegar os seus jornais.

Sean era conhecido como o jornaleiro mais rápido da área. Sabia jogar o jornal lá da calçada de um jeito que caía direitinho na entrada perto da porta de cada casa, de forma a não se molhar.

Apesar da vida ser muito difícil, Sean continuou sendo um garoto alegre. E hoje era um dia para se sentir ainda mais alegre, porque, afinal de contas, era Dia de Natal! Andando pela rua entregando jornais naquela bela, mas fria manhã de Natal, ele fazia uma pequena oração por cada casa por onde passava.

“Deus, dê-lhes um bom dia de Natal e ajude-os a dar valor a tudo o que têm, às suas famílias, casas aconchegantes, presentes e música.”

Sean diminuiu o passo ao pensar em sua mãe, e em sua mão suave e frágil no seu ombro: “Depois que eu partir, Sean, lembre-se de sempre pensar em todas as coisas boas e agradecer a Deus pelos anos que vivemos juntos, e pela vida boa e saudável que Ele lhe deu”.

Já no final da sua rota de entrega, Sean fez uma pequena oração: “Querido Jesus, Você sempre foi meu amigo, e cuidou de mim todos esses meses desde que minha mãe morreu. Sei que Você ouve todas as minhas orações. Eu gostaria de passar o Natal num bom lugar e com alguém legal. Está frio e não é nada divertido ficar aqui na rua sozinho. Por favor, Jesus, se for possível, eu gostaria de ter uma família novamente. Amém!”

* * *

Ali perto, um empresário levantou-se cansado da cama. Ela tinha andado muito ocupado naqueles últimos meses ajudando pessoalmente na construção de casas novas para famílias pobres, organizando shows beneficentes de Natal e fazendo o que podia no abrigo para jovens que haviam fugido de casa e crianças de rua.

O pinheirinho que ele havia comprado permanecia ali sem nenhum enfeite, com umas luzinhas e o festão do lado. Em alguns minutos ele o montou e jogou algodão aos pés da árvore, colocando ali também alguns presentes. Ele tinha intenção de levar esses presentes a algumas crianças num abrigo próximo naquela tarde. Depois disso, sentou-se na poltrona para dar mais uma cochilada.

* * *

Sean chegou à última casa e jogou o jornal em direção à porta. Assim que saiu da sua mão, seu coração quase parou. O jornal voou na direção da janelinha da porta, e depois atravessou-a, jogando cacos de vidro por todo lado.

Ele prendeu a respiração. Ouvira histórias de outros jornaleiros que quebraram janelas, e como os donos das casas tinham ficado bravos. Sua primeira reação foi fugir, mas depois sentiu a presença da sua mãe dizendo-lhe para encarar a situação como um homem. “Afinal de contas”, disse uma vozinha na sua cabeça, “não adianta fugir. Você é o único jornaleiro que faz esta rota”. Com isso, aproximou-se da porta cauteloso, esperando o pior.

* * *

O empresário, acordando sobressaltado com o barulho do vidro estilhaçado, pegou um atiçador de brasas da lareira e foi ver se havia alguém tentando arrombar a porta. Surpreso, deu de cara com um jovem maltrapilho e muito nervoso, que agora estava ainda mais assustado ao ver o atiçador na mão dele. Ao perceber o que acontecera, o homem deu uma boa gargalhada.

— Não tem problema! Não se preocupe! É Natal e você parece gelado. Entre, por favor.

Normalmente Sean teria recusado o convite para entrar na casa de um estranho, mas este homem parecia diferente. Parecia até que ele já o conhecia. Poucos minutos depois ambos conversavam, riam e tomavam um chocolate quente. O homem não pôde deixar de notar as roupas surradas do rapazinho sentado no seu escritório, e perguntou-se como seria a vida dele. Mas, não querendo constranger o rapaz que tinha acabado de conhecer, preferiu não perguntar nada naquele momento.

O tempo foi passando e os dois ficaram absorvidos na sua conversa.

— Eu fui casado muitos anos atrás — disse o homem — mas depois de um acidente no mar, fiquei hospitalizado em estado crítico por muitos meses. Cometeram a um terrível erro, e mandaram uma mensagem para a minha esposa e filho informando que eu estava morto. A minha esposa não sabia inglês muito bem e… seja como for, quando voltei, não consegui encontrar nem ela nem meu filho. Tentei localizá-los, mas não consegui, então achei que… bem … acho que não podia esperar que eles esperassem por mim quando pensavam que eu estava morto, certo?

— Então, depois disso optei por dedicar a minha vida a ajudar os outros — crianças, jovens que fugiram de casa, os pobres e os sem-teto. Já desisti de encontrar a minha família, mas peço a Deus para que onde quer que estejam, estejam seguros e felizes.

— Talvez, se não fosse por essa tragédia na minha vida, eu jamais teria estendido a mão aos outros para ajudar os menos afortunados do que eu.

Uma lágrima rolou pelo seu rosto. Depois, se recompôs e disse rindo:

— Bem, você provavelmente não está interessado em ouvir toda a minha falação. A propósito, eu me chamo Jerry Lando. E você?

Sean não sabia o que dizer; sentia-se desorientado após ouvir a história do homem. Olhou ao redor e reparou numa foto de um jovem abraçando uma moça com um bebezinho nos braços. Por um momento, Sean ficou tonto. A mulher na foto era a sua mãe. Ficou sentado por um momento atônito, depois sussurrou:

— Eu… eu me chamo Sean…. pa… pai? A mulher… a mulher naquela foto, é igualzinha à minha mãe — e o homem é o mesmo que eu vi numas fotos antigas que a minha mãe tinha.

— Sean? … Você disse que se chama Sean? — perguntou Jerry pálido.

— Sim, sou eu ... pai!

Por um instante, que pareceu uma eternidade, o rapazinho e o homem ficaram se observando. “Será que é verdade mesmo?!” perguntava-se o homem. Ele procurara tanto e tivera tantas desilusões. Era demais imaginar que naquele momento inesperado, conversando com um jovem atribulado, estava falando com o seu filho há muito perdido.

O homem começou a chorar e Sean também ficou com lágrimas nos olhos. Estendeu a mão e tocou o ombro do homem, e num instante viu-se nos braços do seu pai há muito perdido. Finalmente, o homem disse:

— Graças a Deus você está em casa, finalmente a salvo! Conte-me tudo! Como está a sua mãe?

A emoção de Sean por reencontrar o pai subitamente transformou-se em tristeza.

— Mamãe ficou bem doente, e um médico muito bom cuidou dela e tentou ajudá-la, mas ela estava com a saúde bem fraca. Ela me disse que sabia que ia para um lugar melhor, e depois morreu — disse Sean reprimindo um soluço.

— Quando estava no hospital eu fiquei com medo de todas as perguntas que me fizeram e da polícia e das assistentes sociais, então fugi, e desde então moro debaixo do viaduto na rua 14.

Os dois choraram enquanto Sean contava a sua história. Depois abraçaram-se, gratos por estarem juntos novamente.

— Você está com fome, Sean?

— Muita — respondeu o rapaz.

— Então vamos comer em algum lugar e depois fazer umas compras. Você parece estar precisando de roupas novas e de um bom banho com água quente.

Naquela noite, o pai e o filho comemoraram todos os Natais, dias de Ação de Graças, Dia dos Pais, aniversários — e tudo em que conseguiram pensar — que tinham perdido. E o que é mais importante, agradeceram ao grandioso Deus de amor que respondera às suas orações e os reunira novamente.

Autor desconhecido. Ilustrações de Yoko Matsuoka. Design de Roy Evans.
Publicado pelo My Wonder Studio. Copyright © 2018 por A Família Internacional
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Tagged: histórias infantis, fé, promessas de deus, natal