Meu Estúdio Maravilhoso
Tremores de Descontentamento
Segunda-feira, Outubro 18, 2021

Resmunga, resmunga, reclama, murmura!

— Oh, não! — pensou Escavador. — Ai vem o Caminhão Basculante outra vez, sempre reclamando. Vou manter o bom humor e continuar escavando.

Resmunga, reclama, murmura, chia, geme! Bum!

— Oi, Seu Basculante! Está tendo um bom dia?

— Humm — foi a única resposta do mal-humorado Basculante.

O caminhão Basculante parou bem na frente de Escavador, de costas viradas para ele. Estava com uma carranca daquelas!

A comprida pá de Escavador desceu e escavou um monte de cascalho, poeira, pedras e terra. Levantou lá no alto e desceu a pá novamente, despejando o conteúdo na caçamba do caminhão, que então saiu resmungando com sua carga.

Ora, pensou Escavador. Estou feliz fazendo o melhor que posso neste trabalho. Que posso fazer? Gostaria que o caminhão Basculante também estivesse feliz com o seu trabalho.

Minutos depois, o caminhão Basculante voltou murmurando e reclamando para pegar outra carga de terra que Escavador esperava pacientemente para lhe dar.

— Alguns elementos têm uma vida tão fácil — resmungou Basculante.

Vou continuar sorrindo, pensou Escavador. Vou tentar encorajá-lo. Este é o meu trabalho e tenho que fazê-lo, então vou fazer com alegria.

* * *

O Sr. Supervisor, o empreiteiro da GALERA (que significa Grupo Assíduo de Labuta Edificante e Recompensadora e Associados) estava preocupado porque o projeto não transcorria tão tranquila e eficientemente como ele esperava. Ele observava esse cenário do seu escritório, que ficava ao lado da grande construção. Já percebera há tempo que Basculante estava arrastando os pneus e fazia o trabalho sem inspiração alguma.

Então o Sr. Supervisor desceu e chamou o Sr. Basculante de lado.

— Está tudo bem, Basculante? — Perguntou. — Por que você está sempre tão triste e mal-humorado?

—Sabe o que é — queixou-se Basculante. — Todo o santo dia tenho que carregar e despejar as cargas pesadas de Escavador. Está ficando muito chato e pesado. Ninguém me dá mérito por nada nem agradece por isso. Mas veja como todos admiram Escavador. O grande e poderoso Escavador! As criancinhas que passam ficam maravilhadas admirando-o, mas nunca me notam. Nunca dizem nada sobre mim.

— Ele tem uma vida boa; o trabalho dele é fácil e divertido! Pode ficar ali mostrando o quanto consegue levantar, enquanto eu tenho que ficar de um lado para o outro, fazendo humildemente todo o trabalho sujo... para ele!

— Puxa vida — disse o Sr. Supervisor. — Vou ter que pensar sobre isso.

* * *

O empreiteiro então caminhou até o outro lado do imenso canteiro de obras. Havia tanto trabalho sendo feito! Estavam empurrando, levantando, quebrando, enchendo, escavando, nivelando e limpando grandes quantidades de terra, lama, pedras, solo, cascalho e concreto, tudo para preparar o terreno para a construção do lindo hotel de veraneio “Costa Del Sol”.

Mas em meio a toda a confusão, o Sr. Supervisor percebeu uns tremores de descontentamento.

* * *

Depois ele viu Guilherme Guindaste trabalhando bem devagar com uma expressão um tanto rabugenta. Ele estava levantando e posicionando uma parede de uma pilha que a Srta. Natasha Despacha havia entregado.

Dessa vez, era Guilherme Guindaste quem estava bem triste enquanto a Srta. Natasha Despacha estava bem feliz. Ela ia e vinha alegremente, entregando janelas e portas e empilhando-as devagarzinho e de forma organizada, cantarolando alegremente enquanto trabalhava.

Enquanto Natasha estava fora pegando outra carga, o Sr. Supervisor aproveitou a oportunidade para perguntar ao Guilherme Guindaste a razão da sua tristeza.

— Bah! — disse ele ressentido. — Tudo é tão fácil para a Srta. Natasha Despacha! Ela pode ir a vários lugares e visitar todas as fábricas enquanto eu só fico aqui neste lugar trabalhando até não aguentar mais. Parece que ela está de férias constantemente, cantarolando pelo caminho, e nem se dá conta do trabalho que tenho que fazer. Vou te contar, é trabalho duro! O meu trabalho nunca termina. E quando finalmente tenho uma oportunidade de descansar o braço, ela volta com outra pilha de janelas ou paredes.

— Hmm! Vou ter que refletir sobre isto — disse. E foi embora.

* * *

Então viu o poderoso Sr. Buldôzer, que também parecia meio chateado, mas não tanto quanto Basculante e Guindaste. Só parecia um pouco cansado do seu trabalho.

— E aí esteira. Como vão as coisas?

— Tudo bem. Estou ficando meio cansado de sempre ter que empurrar. Nem sou o maior de todos. O Sr.

Nivelador de terras é maior do que eu, mas até ele eu tenho que empurrar! Falando nisso, aí vem ele!

O Sr. Nivelador chegou lentamente, e bufando enfiou a sua grande lâmina na terra. Depois, empurrou a terra para a grande caçamba atrás dele, raspando e limpando uma enorme faixa de terra de uma só vez. Virou e olhou para trás, orgulhoso do impressionante trabalho que fizera. E com um enorme suspiro parou, com as enormes rodas presas na terra.

— Buldôzer? — chamou ele. — Não vê que estou preso? Estou esperando você me dar um empurrãozinho!

— Já vou! — respondeu — descendo lentamente a ladeira e parando bem atrás do Sr. Nivelador. Com muito esforço ele empurrou o Nivelador, tirando-o da pilha de terra na qual estava preso. Planador então prosseguiu impacientemente.

— Viu só? — queixou-se Buldôzer, virando-se para o Sr. Supervisor. — Esses caras vem aí empurrando cargas enormes e eu tenho que ajudar a empurrá-los. E sabe o quê? Alguns deles, como o Guindaste e o Nivelador, são maiores do que eu, mas ainda assim eu tenho que empurrar, empurrar e empurrar o dia

inteiro! É claro que a maior parte do tempo tenho que empurrar o Nivelador e ele é um valentão orgulhoso. Não quer ser empurrado; é humilhante para ele! Mas no tipo de trabalho que faz, ele cai em algumas enrascadas, e tenho que estar lá para livrá-lo delas. Quase não tenho descanso! Quem me dera poder ter um momento de descanso!

— Mas quer saber? Não é que eu me importe tanto de ter que ficar empurrando; o problema é que ninguém me agradece nem demonstra apreço. Eles resmungam porque tenho que empurrá-los, mas se não chego logo como querem, também reclamam! Ainda por cima, sempre ficam me lembrando do quanto trabalham e se gabando das suas realizações.

Buldôzer parou por um momento. Percebeu que estava falando mal dos outros e ficou envergonhado.

— Mas outro dia, um deles me agradeceu... apesar de bem baixinho. E disse que realmente me apreciava. Sei que não foi fácil para ele, sendo um cara tão grande, forte e orgulhoso; mas seja como for, ele me agradeceu. E sabe o quê? Aquilo fez o meu dia!

O Sr. Supervisor agradeceu a Buldôzer pela conversa. Puxa vida, acho que vou ter que refletir sobre isso, pensou. E depois continuou o seu caminho, ainda preocupado com os tremores debaixo de seus pés.

* * *

Foi então que se deparou com Escavinha, a pequena Retro Escavadora, que estava sozinha, cavando e escavando sem parar, fazendo outra vala para drenar a água da chuva. Ela estava assobiando baixinho e alegremente, mas parecia um pouquinho solitária em meio aos montes de areia e terra. Não

havia caminhões, moto niveladoras nem buldôzeres para lhe fazerem companhia.

— Tudo bem, Escavinha? Você parece feliz hoje!

— Ah sim, estou feliz!

— Mas você não se sente um pouquinho solitária trabalhando aqui sozinha?

— Sim senhor, Seu Supervisor. Às vezes me sinto solitária porque não posso trabalhar com os caminhões grandes. Mas agora, disse com um grande sorriso no rosto, ao enfiar a pá no solo. Estou feliz cavando estas valas e construindo castelos de areia.

— Castelos de areia? Não vejo... ah sim... — disse o Sr. Supervisor vendo os montes de areia ao lado e percebendo que ele brincava de faz de conta. — São lindos castelos de areia!

— Estou aprendendo. Talvez um dia ajude a construir um castelo de verdade, como as outras máquinas.

— Mas Escavinha, você está ajudando a construir um castelo de verdade. Sem estas valas para drenagem, os edifícios ficariam alagados.

O Sr. Supervisor se despediu e continuou caminhando pensativo.

— Vou ter que pensar sobre isso... já sei! — Exclamou. — Mas que boa ideia!

* * *

— Atenção todos os equipamentos de construção — disse o Alto-falante da sua posição elevada no telhado do escritório do empreiteiro. A sua voz ecoou pelo canteiro de obras, ela era tão alta e barulhenta que sempre que fazia um anúncio, todas as máquinas paravam o que estavam fazendo e prestavam atenção.

— Haverá uma reunião hoje no alicerce da obra às 19 horas, depois do trabalho. O Sr. Supervisor pediu para todos comparecerem.

— Ai, ai, ai! — disse Escavador. — Parece coisa séria.

— Sobre o que será? — resmungou Basculante. — Eu tinha outros planos.

— Aposto que o Sr. Supervisor está zangado conosco — disse o Sr. Guindaste. — Ele provavelmente vai ficar falando por horas.

— É melhor eu me arrumar — disse a Srta. Natasha Despacha.

— Eu também — disse Nivelador, flexionando sua grande estrutura de aço. — Nunca se sabe quem vai estar lá.

— Vejamos — resmungou Sr. Buldôzer. — É melhor eu me preparar para empurrar alguns desses caras se quisermos todos chegar a tempo.

Legal, pensou Escavinha. Vou poder estar com os outros.

— Por favor, sejam pontuais. E não se preocupem — acrescentou Alto-falante — vocês não se meteram em encrenca.

* * *

Apesar de alguns estarem um pouco preocupados com o assunto da reunião, havia um ar de antecipação e empolgação enquanto as máquinas de construção roncavam em direção ao alicerce.

A Srta. Natasha Despacha chegou bem na hora, seguida por Escavinha, que estava radiante por estar acompanhada por Escavador. O Sr. Guilherme Guindaste e o caminhão Basculante vinham atrás reclamando e resmungando, relutantemente arrastando as rodas. Finalmente, o Sr. Nivelador chegou todo brilhante, sendo empurrado pelo cansado e irritado Sr. Buldôzer.

Muitas outras máquinas também apareceram. Cimento Bomba e seu robusto irmão Betoneira; a magra Empilhadeira; a Moto niveladora; o Rolo Compressor e sua artística namorada, a Srta. Pinta Faixa; o Sr. Asfaltador; e (para a tristeza de todos) o Sr. Demolidor e seus dois filhos Triturador e Destruidor.

Todos tentaram pegar os melhores lugares mais na frente, exceto Triturador e Esmagador, que ficaram lá atrás desinteressados, dando risadinhas.

O Sr. Supervisor limpou a garganta quando começou a falar.

— Estou muito feliz por todos poderem vir. Prometo que serei breve, pois sei que tiveram um dia longo e cansativo.

— Com certeza — murmuraram Guindaste e Basculante.

— Com a ajuda do meu amigo, Sr. Alto-falante, gostaria de conversar com vocês sobre algo que acho que precisamos melhorar para que a GALERA possa trabalhar em união com mais eficiência e alegria.

— Quero enfatizar que estou muito, mas muito satisfeito com o seu trabalho. Este projeto não poderia ser realizado sem a sua ajuda. Entretanto, ao caminhar pelo canteiro hoje, não pude deixar de perceber tremores de descontentamento!

As máquinas se surpreenderam.

— É, dá para ouvir! — disse uma das máquinas.

— Consigo senti-lo na minha carcaça! — disse outra.

O Sr. Supervisor abaixou a voz e falou quase em sussurro:

— E todos sabem das graves consequências se isto continuar assim.

— É claro! — Disse o Sr. Nivelador, que entendia do assunto. — Os tremores no solo podem resultar no deslocamento de grandes quantidades de terra, arruinando muitos dos meus esforços.

— Também aumentaria em muito a minha carga de trabalho, eu teria que mover toda a terra — disse o caminhão Basculante. — Se acho que é difícil agora, aí ficaria realmente difícil. Demoraria uma eternidade para terminarmos este projeto.

— Isto sem mencionar as paredes e janelas que coloquei no lugar tão cuidadosamente — disse o Sr. Guindaste. — Tudo desabaria.

— Imagine o perigo que todos nós correríamos! — Disse a Srta. Natasha Despacha.

— Dá um tempo! — reclamaram Triturador e Esmagador. — Isso não é nada. Nós aguentamos.

— Poderia causar grandes rachaduras nas estradas que trabalhei tanto para nivelar, disse o Rolo Compressor.

— Oh não, isso arruinaria as belas linhas brancas que pintei! — disse a Srta. Pinta Faixa.

— Se quiserem, dediquem um tempo para refletir sobre o que cada um de vocês pode fazer para acabar com esses tremores que estão atrapalhando o trabalho e que podem causar danos ainda maiores — disse o Sr. Supervisor.

O silêncio era completo na construção, quebrado apenas pelo nervosismo de Triturador e Esmagador, que estavam irrequietos.

Todos pararam para refletir sobre a sua recente atitude, e imaginaram como seria difícil trabalhar se os desastres previstos pelo Sr. Supervisor acontecessem.

— Sinto muito se entristeci você com os meus resmungos — sussurrou Basculante para Escavador. — Você me perdoa?

— Claro que sim, Basculante. Não acho que teria forças para ir de cá pra lá carregando as cargas pesadas que você carrega o dia inteiro. Estou muito grato por você.

Guilherme Guindaste colocou seu longo braço ao redor da Srta. Natasha Despacha.

— E me desculpe por ser um colega de trabalho tão chato. Nunca percebi como a minha situação é Boa.

— Tudo bem, Gui. Quero que saiba o quanto o admiro pela sua perseverança no trabalho. Ficaria doida se tivesse que ficar em um só lugar o dia inteiro como você.

— Obrigado, Buldôzer, por nos dar um empurrãozinho sempre que precisamos — disse o Sr. Nivelador. — Nenhum de nós poderia realizar as nossas tarefas sem você. Desculpe-me por reclamar!

— Não há de quê, Nivelador — disse Buldôzer.

* * *

O sol se pôs e os holofotes iluminavam a feliz cena no canteiro de obras enquanto todos se desculpavam, riam e conversavam entre si. De repente um deles gritou:

— Parou!

—Parou? O que parou?

— Os tremores! Escutem! Os tremores de descontentamento acabaram!

— É verdade — disse outro. — Também não sinto mais nada. O solo está tranquilo!

O Sr. Supervisor suspirou aliviado enquanto a multidão dava vivas de alegria. Ele então começou uma festa que foi até altas horas da madrugada. E todas as máquinas receberam uma dose extra de combustível.

— Amanhã de manhã estão todos de folga — anunciou o Sr. Supervisor. Buldôzer ficou muito agradecido por essa folga.

* * *

E assim chegamos ao final da nossa história. Daquela noite em diante o ambiente no canteiro da GALERA era bem diferente.

Todos estavam felizes com o seu trabalho, todos excetos o Sr. Demolidor e seus filhos Triturador e Esmagador, que partiram porque os seus serviços já não eram mais necessários. Eles só ficavam felizes quando tinham algo para quebrar, derrubar ou destruir. Para alegria do Sr. Supervisor e do Sr. José do Patrocínio, que tinha financiado tudo, o projeto foi terminado antes do prazo.

No dia da inauguração do hotel Costa Del Sol, todas as máquinas de construção tinham que sair de lá antes dos visitantes chegarem. Escavinha estava no final da fila. Saía pelo portão quando ouviu um dos primeiros visitantes dizer:

— Ouvi dizer que o sistema de drenagem daqui é um dos melhores do mundo!”

Autoria de Gilbert Fenton. Ilustrado por Jeremy. Colorido e design de Roy Evans.
Publicado pelo My Wonder Studio. Copyright © 2021 por A Família Internacional.
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Tagged: contentamento, histórias infantis, trabalho em equipe